quinta-feira, 19 de julho de 2018

21 fatos sobre ela

1. É intensa, pois não pensa antes de viver; vive por existência.
2. É dramática, porquanto chora sem a necessidade de lágrimas, ou mesmo sem a necessidade de dramatizar. Está em sua essência; é um costume, mesmo que fugaz.
3. É generosa. Pensa, de fato, muito em si, mas não em detrimento do outros. Sempre que pode, faz tudo a seu alcance.
4. É perspicaz, logo que a ideia surge, como uma pedra atirada ao vento, ela percebe antes mesmo do que meros mortais pudessem recepcionar tal ideia.
5. Ela inunda. Nada sobra. Se ela entra em sua vida, ela se faz presente. Sempre.
6. Dorme bem. E como dorme. Tanto que, às vezes, só come e dorme.
7. Fala, muito. Mesmo que você esteja tentando entender uma parte crucial de um filme, ela estará lá comentando. Até futebol, ela comenta. Há quem não goste, mas eu gosto. É engraçado.
8. Por falar em ser engraçado, está aí outra coisa que ela também é. Há momentos em que precisamos cortar o fio do bom senso e realidade, rir, então, da vida, e satirizá-la.
9. Ela esquece muitos acontecimentos, outros, porém, os quais deveria, não esquece.
10. Ambiciosa. Porém não quer o mundo, apenas metade dele.
11. Carinhosa. Não se acomoda, não se cansa. Faz em sua naturalidade, nela há carinhos nos gestos, expressões e toques.
12. Gosta de uma encrenca. Mesmo que, para mim, seja demais, ela não deixa nada barato.
13. O fato de ser encrenqueira vem de sua persistência. Se ela quer algo, da-se-á um jeito.
14. Ela é muito objetiva em seus planos de vida, só não é muito objetiva na fala: prolixa e repetitiva, mas até aqui está tudo bem.
15. Morre de medo de se afogar. Alega traumas de vida passada. Vai saber.
16. O pecado da gula. Não sei se Deus será capaz de perdoar.
17. Apesar da gula, só gosta do que não presta: ou tem gosto ruim ou baixo valor nutritivo. Quem é que gosta de chá de bodo?
18. Muito criativa. Possui um dom inato para produção de eventos.
19. Ela tem uma capacidade de aprender acima do normal, e, em suma, de maneira autodidata. Bastante analítica e observadora, ela surpreende quando assimila algo inesperado.
20. Mostra resignação. Por mais que sofra com as intempéries que a vida traz, ela é capaz de aceitar e entender. Sem contar que se adéqua sempre que possível, a fim de propiciar o que entende ser o melhor.
21. Completa 21 anos exatamente hoje.

sexta-feira, 13 de abril de 2018

Singular

     Nós sempre achamos que sabemos o que estamos fazendo, então eu espero que eu saiba o que eu estou fazendo. Nós sempre achamos que sabemos o que estamos sentindo, então eu espero que eu saiba o que eu estou sentindo. Esse é o problema, não é? Em tudo, queremos achar os cálculos envolvidos na percepção dos sentimentos, como se houvesse uma boa explicação para entender o porquê do amor, antes mesmo de poder, até, defini-lo. Não irei me ater a explicações lógicas, por mais que eu sempre as tente conhecer.
     Prefiro falar das sensações, dos gestos, dos atos, das expressões que me encantam. É genuíno e, ao mesmo tempo, mais fácil de se compreender. As percepções estão assentadas no empírico, nas experiências vividas, nos deleites apreciados pelo senso comum. Então, quando você me pergunta por que eu te amo, é muito difícil de responder ao certo. Mas posso reduzir a resposta em: o que você me faz sentir. E posso ir mais além, até onde minha consciência consentir.
     Eu começarei pelo cuidado. Quando nos conhecemos, ou melhor, quando nos vimos pela primeira vez, eu a avistei de longe. Você me procurava. Olhava meio confusa aos arredores, perguntando-se: onde ele se meteu? Fui em sua direção, os primeiros olhares recíprocos surgiram, os primeiros sorrisos. Foi tudo muito natural. Éramos desconhecidos, mas não, não parecia. Nos primeiros contatos, seres de energia que somos, eu já tive a primeira sensação: alguém cuidadosa com as palavras, com as atitudes, extremamente receosa em fazer as pessoas se sentirem bem. Você tem esse cuidado, por mais que o perca em momentos peculiares.
     Abraço. Esse é outro ponto importante, e daqueles inexplicáveis. Eu tenho meu corpo; você, o seu. Mas por que essa sensação de unicidade quando nos abraçamos? Algo me diz: fique aqui. É como se sentir coberto pela água do mar. Mas uma água fria, que impacta no começo e, depois, nos acolhe, acalma. Tudo que eu sinto é a vontade de ficar ali, nada mais. O mundo? Ele pode esperar. A casa está em chama? Tudo bem, a chuva apaga. Preocupações? Não existem. Mas há outros tipos de abraços: aquele com sorriso subsequente, acompanhado pelo olhar expressivo; aquele abraço que diz "estou insegura" ou "estou cansada, vou me encostar aqui"; aquele, por causa da saudade, abraço bem apertado, entre outros.
     Agora seguimos com a paz. Essa sensação é criada em situações antagônicas. Mas, olha, ela está ali. Tem horas que eu quero que sejamos pássaros, acalentados pelo sol das 6 da manhã, após um chuvisco, que apenas molhou as flores e ressaltou o aroma de terra molhada. Então, como pássaros, voamos livremente. Rumo desconhecido. Só seguimos e seguimos, porque não importa onde estamos, só importa é que estamos. Então é isso que você me traz, a vontade de sair por aí, despreocupado, em paz. Mas, em oposição, às vezes, eu só queria estar parado, e assim permanecer. Só existir. Uma estátua posicionada no topo de uma colina, apenas apreciando o horizonte. Pelo visto, a paz vem não é pelo que estou fazendo, mas sim com quem estou naquele momento. Você.
     E o sorriso? Não há como competir com o seu sorriso. Ele é lindo, expressivo, diz tudo o que você está sentindo, em todas as suas variações. Você sempre fala do meu, mas é o seu que eu admiro. Seja ele sem graça, envergonhado, sarcástico, espontâneo, incontido, alegre, desesperado, nervoso; seja ele e sua causa quais forem, o importante é vê-lo. E sempre será. É meu combustível, minha motivação. Ele e suas inúmeras finalidades, que vão de trazer esperanças a trazer calma. Um sorriso favorito? Aquele acompanhado dos olhos cerrados, cabeça inclinada para o lado, expressando: qual o seu problema, garoto?
     Por fim, mas só por agora, a impaciência. Não, ninguém gosta de pessoas impacientes. Mas, de certa maneira, eu acho engraçado quando você fica impaciente, ainda mais quando você quer saber alguma coisa. E é bem fácil fazer isso acontecer:
- Se liga...
Pronto, se eu não falar nada após isso, você fica emburrada. Sorte minha que sempre uso o celular no silencioso. Então, para praticar a paciência, que é algo sempre positivo em nossas vidas, eu deixarei o restante do texto para depois. Você vai dizer: ah, mas você está fazendo isso só porque está com preguiça de continuar. E é verdade, você me conhece muito bem. Há muito o que escrever sobre você, sobre a nossa história, mas tudo virá em seu devido momento. Porém, antes de concluir, eu não posso esquecer de uma coisa, se liga...

segunda-feira, 26 de março de 2018

Tudo tem seu tempo

     Edmund, não sei bem com quem falar. Poucas pessoas sabem da minha história, e você é o único com quem me sinto confortável.
     Então, não sei bem de onde vem esse tormento, mas estou me sentindo preso a duas escolhas, ambas de aparência definitiva. Nos primeiros meses do meu término com Elisabeth, eu me senti bem, e não teria como ser diferente. Foi um alívio. Mas, desde o fim do ano passado, eu me pego pensando nela. A intensidade aumentou este ano. Obviamente, eu nunca cogitei vê-la. No atual momento da minha vida, isso não era uma opção. Eu tinha tudo planejado: resolveria minhas pendências, alcançaria meus objetivos, e então a procuraria. Mas acontece que ela me procurou primeiro.
     Quando eu fui embora, fiz questão de não deixar rastros, consegui bloquear qualquer tipo de contato que poderíamos ter. Mas acontece que, de alguma forma, ela achou meu endereço. Sábado de manhã, eu acordo com uma carta de Elisabeth. Nesta, ela pede desculpas por tudo que aconteceu, disse que, à época do nosso relacionamento, ela passava por um momento difícil e de grande estresse. Enfim, tudo que é de praxe. Acreditar ou não em tudo que ela disse é mais uma questão de fé.
     Ontem, eu a vi, tudo ocorreu bem. Mas, desde ontem, antes mesmo de vê-la, eu senti que dei um passo de difícil retorno: eu não devia ter respondido a sua carta. Algo me prende, é um certo medo. Ou Deus está me testando, ou ele a quer na minha vida.
     Tudo se resume em escolhas. Eu já a expliquei a minha situação, passo por um momento difícil no qual eu não poderia me comprometer com nada, não poderia arriscar esse meu projeto de vida em curso. Ela diz que entende e que não quer atrapalhar. Eu digo que não é o momento certo, ela diz que não quer ficar longe de mim e quer estar ao meu lado nas minhas conquistas. Mais uma vez, acreditar ou não é mais uma questão de fé.
     Eu sei que parece não fazer sentido. Racionalmente, nada faz. Eu me aconselharia do mesmo jeito que o senso comum. Eu não sou idiota, eu sei de tudo que aconteceu. Não é tão fácil ela aparecer do nada, achar que mudou e que tudo vai ser diferente. Pessoas erram, eu errei, ela errou. Erros distintos em sua intensidade e natureza. Cada um lidou com a situação à medida de sua maturidade. E esse é outro problema. Nada do que aconteceu parece me afetar. A minha vontade de fazer tudo dar certo é tão grande que me faz ignorar o passado.
     Mas nada na vida é tão simples, né? Não existe essa história de seguir o coração. Às vezes, o sentimentos nos manipulam. É preciso ter responsabilidade e pensar à frente. Sem contar que é claro que eu tenho medo de reviver tudo aquilo novamente. Então como ignorar uma pessoa que, desde o começo, lhe trouxe tantas certezas e, posteriormente, tantas dúvidas? Consegue entender? É difícil por em palavras. Sentimentos são tão difíceis de se lidar, imagine descrever.
     É como se eu não soubesse o que é certo ou errado. A pessoa que você tanto gosta está ali pedindo para fazer parte da sua vida. Um ano se passou, o interesse dela ainda subsiste. Parte de mim quer sumir para evitar todo esse problema. A outra parte é a que ainda pensa nela em momentos aleatórios. É um dilema. Se digo não, talvez seja o último não. Ela seguirá a vida, conhecerá outras pessoas, e então será tarde demais. Se eu digo sim, é um caminho desconhecido, em que tudo pode acontecer. É isso.

Edmund, duas horas depois, eu voltei aqui para finalizar esta carta. Eu me decidi e retornei a ela: eu disse não. Deixarei abaixo o verso da bíblia que me auxiliou. Em deus, sempre haverá respostas.

"Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu.
Há tempo de nascer, e tempo de morrer; tempo de plantar, e tempo de arrancar o que se plantou;
Tempo de matar, e tempo de curar; tempo de derrubar, e tempo de edificar;
Tempo de chorar, e tempo de rir; tempo de prantear, e tempo de dançar;
Tempo de espalhar pedras, e tempo de ajuntar pedras; tempo de abraçar, e tempo de afastar-se de abraçar;
Tempo de buscar, e tempo de perder; tempo de guardar, e tempo de lançar fora;
Tempo de rasgar, e tempo de coser; tempo de estar calado, e tempo de falar;
Tempo de amar, e tempo de odiar; tempo de guerra, e tempo de paz."


Eclesiastes 3:1-8

terça-feira, 5 de abril de 2016

Resignação

Não é fácil se redimir,
Olhar o chão e aceitar.
Ver aquele corpo caído,
Saber de nossa culpa
E chorar.
Não é fácil nascer primavera
E no verão ter que mudar.
No momento,
Avante em que nos persiste,
Sabemos que nada nos assiste
Quando depois do inverno
Eu tiver que voltar.

Saber da minha realidade
Eu sei, mas não aceito.
Sempre me acho perfeito
Em achar em mim defeitos
Que surgiram
De tanto eu falar.
Reconheço-me como um ser
Que morre todo dia.
Cai meu corpo, e me vejo
Deitado sobre o meu desejo
De respirar o meu próprio ar.

Meu Deus,
Como eu gostaria de mudar;
Aprender a escutar
E lidar com meus problemas;
Lavar a alma
E vê-la serena;
Respingar as gotas
E amanhecer sozinho.

A cada troca de pele,
A cada nova estação,
É um dia que se perde
Mas se ganha ambição.
A cada renascimento,
Eu descubro o momento
Em que me vejo livre
Desse peso que insiste.
Eu me vejo livre
De tudo que não absorvo.

Cuidar-se, como se cuida
De seu bem mais valioso,
Não se deixar empoeirar.
Saber amar como se de longe
O mundo também soubesse amar.
Aprender a dizer não,
Quando o sim é mais fácil,
Mas te dói.
Saber suportar aquilo
Que por dentro destrói,
E limpar-se do resquícios
De um passado
Que não passou.

Não és o mundo,
Está tudo tão longe de ti.
Então faça surgir
Lá do fundo,
Tudo que te faz sorrir.
E sorria.
Prender-se aos outros
Não te favorece.
Prender-se ao passado
Não te engrandece.

Reviver não é viver,
É se submeter ao sofrimento.
Guardar rancor
Não é reconhecer,
É se ver no lamento
Das experiências passadas
Que te causaram dor.

No fim de tudo,
Apenas desprenda do corpo,
Escute-me aos poucos,
Torne-se mudo.
Então aprenderás
Que sua alma ainda vive,
E o peso que em ti
Ainda persiste,
A tudo resignarás.

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

É cedo demais

     É cedo demais para eu pensar em nós? Eu acho. Assim, como se acorda cedo para se tomar o batente, eu penso que é cedo demais para externar tudo que eu gostaria de te falar. Então, eu te escrevo. Mas, também, me recaio pensando que é cedo demais para te escrever. Porém, será, isso tudo, o medo que eu tenho de me entregar? Será a dificuldade que eu tenho de acreditar em nós? Na verdade, eu acredito que seja um pouco dos dois. Tenho medo de acreditar na gente e acabar quebrando a cara, como é de costume, porque eu apostei na coisa errada.
     Já me foi dito que não se brinca no raso, é preciso arriscar; é preciso criar nadadeiras e nadar contra o mar. Querer um relacionamento fácil, viver com pessoas fáceis, é querer desertar das oportunidades de se autoconhecer, amadurecer. É reconhecer-se um problema que se esvai na fuga de si mesmo. Mas, eu quero o contrário, quero crescer diante do que me é difícil, romper paradigmas. Eu não quero ficar acomodado, viver uma mentira de verdade. Eu quero uma honestidade duvidosa, e que essa dúvida recaia sobre mim, o autor das minhas próprias ilusões. Eu quero me expor a esse momento fortuito que é te ter ao meu lado.
     Certamente, há diversas palavras soltas, em minha mente, que eu gostaria de juntar. Pois nelas conteria tudo aquilo que sinto, mas ainda acho cedo para te falar. Reconheço que são determinadas angústias, alguns fantasmas do passado, que me fazem recuar. Às vezes eu até evito de pensar. Acabo só pensando em ti, assim, num todo, em tudo que você me traz. Eu já entreguei nosso futuro a Deus. Não me cabe ficar pensando no quiçá. Se, porventura, nos é dado o direito, eu encontrarei o direito de tentar.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

A lua e a vela

     Todos nós temos alicerces, por que eu não sou o seu? Fico um pouco indeciso, sabe? Eu te deixei cair. Era noite, você segurava uma vela na mão, o vento a apagou. Tu mal sabias que eu que soprara com a mesma intenção. Eu queria pouca luz, a da lua já bastava. Mas te fiz cair, ficastes sem percepção, sem rumo. Tudo a sua volta se enturveceu. Eu tirei sua luz e não te segurei. Quem me dera eu ser teu alicerce, mas, infelizmente, eu não aguento nem meu próprio peso. Ainda bem que nunca te fiz promessas, caístes por confiar demais. Mas, mesmo assim, ainda fico sem entender o que fazer. Levanto-te? Trago esse seu torso para perto do meu? Tu tens esse mundo que pintantes das cores mais inusitadas, mas algumas delas eu não gosto. Devo, então, ignorá-las, emoldurar esse seu mundo e pendurar em meu quarto? Talvez traga novas cores para o ambiente. Mas e se esse quadro cair, deveria eu me preocupar que não o preguei direito? Eu não gosto de derrubar as coisas, vê-las cair, quebrar, ter seus pedaços esparramados pelo chão. Eu não sou bom em organizar a bagunça que faço. Se eu te bagunçar, eu não saberei como arrumar.

sábado, 2 de janeiro de 2016

#Diário de Klauss - Meu primeiro diário (V)

     Era, então, um novo começo. É estranho eu falar assim, porque eu era apenas uma criança, não era uma mudança tão significativa no sentido de vivência, pois eu não vivera muito, só tinha 3 anos, e possivelmente só tinha consciência de meses. Claro, todo afastamento de uma criança com sua mãe acarreta em indeterminados problemas em seu âmago. A mãe é a parcela constante na criação de seu filho, não apenas as mães de sangue, mas também a referência que a criança tem em seus primeiros estímulos. Essa ligação pode se dar a indeterminados seres. Mas o que realmente é importante saber é do ponto referencial dessa criança na sociedade, e isso eu chamo de maternidade. Não sou a pessoa certa para falar do lado paterno, ou talvez eu seja, pois sofri as consequências de sua ausência. Conheci meu pai quando eu já era mais velho, e essa experiência não foi nada revitalizadora. Por mais engraçado e controverso que seja, pois no caso foi, literalmente, revitalizador e renovador. Mas não é história para agora.
     Irei partir do princípio que não tive muitos estímulos significativos durante minha viagem para a casa de meu tio. Tudo que lembro, claro, vagamente, assim como tudo que relatei, são palavras soltas e algumas sensações possíveis que tive nesse período de separação. No geral, oi uma viagem tranquila, não tivemos nenhum problema. Passei grande parte da viagem em cima do transporte, enquanto a maioria dos soldados e outras pessoas seguiam a pé, pois entre malas e várias outras crianças, não houve espaço para todos. Eu como qualquer criança de 3 anos não tinha a condição necessária para caminhar em tal viagem, então digo que foi justo esse meu lugar. Tudo que se passava na minha mente naquele momento era a admiração por aqueles soldados. Acredito que isso se passa com todas as crianças, porque eramos ensinados, desde muito novos que todo soldados eram os heróis da nação da Triangular. E toda a criança gosta dessa narrativa de heróis. Ainda mais eu que já sabia naquela época que meu pai fora um dos maiores soldados e comandantes de todos os tempos. Com o passar dos anos não fui entendendo muito bem como isso era possível, pois eu e minha mãe não tínhamos a menor capacidade de viver na capital e muito menos de ter alguns privilégios que o ouro nos traria. Se eu puder relatar uma das, ainda, inconveniências da Triangular, eu diria que é sua base na circulação de ouro como moeda de troca. O ouro sempre foi muito importante para a Triangular, desde que foi usado como matéria prima para diversos artefatos, tais como os equipamentos de guerra; os arsenais em geral; as decorações; na construção de muitos materiais, principalmente no conversor de energia. Por ser o ouro o minério mais requisitado, ele virou uma moeda de troca muito importante. Então, em resumo, pois lembro-me que abordo esse assunto em um dos meus diários, digo que nunca tivemos um posicionamento social privilegiado pela posse do ouro. E se meu pai fora tão importante, onde estaria nossa efêmera, mas ainda sim, riqueza?
     Pois bem, chegamos ao ponto em que eu ganharia meu primeiro diário. Pulei alguns anos, pois estes são tão significativos como de qualquer outra criança. Eu brincava, corria pelo campo, gostava muito de cuidar dos animais. Minha distração era, e continuou sendo por muitos anos ajudar meu tio nos afazeres da fazenda, ainda mais quando se tratava de cuidar das vacas. Sempre tive essa conexão muito forte com os animais. Todos os dias eu voltava cheio de frutas nos bolsos, vivia indo ao fundo da floresta para colher as diversas frutas que tínhamos. Subia em várias árvores, e aproveitava esse momento único de elevação, não a espiritual, mas sim, a elevação superficial que nos deixava cada vez mais perto das nuvens, aqueles algodões que todas as crianças ficam imaginado como seria tocá-las. A vista, em cima daquelas árvores, era privilegiada. A fazenda de meu tio fica perto da entrada de Ratignar Hauss, e quando eu subia em uma das maiores árvores que ficava em cima de um pequeno morro, eu conseguia ver o portão principal da capital. Era a única coisa que eu chegara ver, pois por mais perto que eu morasse, eu nunca tinha adentrado a cidade. E ao olhar do lado oposto, eu conseguia ver a segunda barreira. Ratignar Hauss e os outros dois Impérios, aderiram a ideia de grande Triangular, onde eles acolheriam os pequenos vilarejos aos arredores, assim como relatei sobre Brosch. Mas nunca indo muito longe, pois também relatei sobre isso. Desde aquela época, a Tringular tinha três barreiras: a da capital; a da segunda zona, onde tinha os vilarejos e campos de colheita; e a terceira zona, onde ocorria a extração de grande parte das matérias primas, os recursos mais bruto, como os minérios. Era um zona quase sem civilização, há relatos de alguns moradores, algumas tribos e vilas, mas elas estão lá bem antes dessa pequena expansão da Triangular.
     Aos meus 7 anos, a idade normal de uma criança aprender a escrever e ler o dialeto, ganhei meu primeiro diário. Eu tinha aulas com o Mestre Jô, um senhor que tinha casa feita de livros, por assim dizer. Ele lia bastante, e nos incentivava a escrever e ler com a mesma frequência que ele fazia. Nos seus tempos livres, ele sempre estava no deck de sua casa, sentado em um banquinho bem na ponta do lago, segurando uma vara em uma mão e um copo de vinho na outra. Ele adorava pescar. Ainda lembro-me muito bem do seu chapéu de palha. Era um ser muito humilde, que vivia dizendo "eu só quero uma casa no campo, onde eu possa compor os meu cantos rurais". Dizia ser uma música que ouvira quando era novo, e que o fez se encantar pela viola. Eu nunca ouvira tocá-la. Mas a viola sempre estava lá, pendurada na parede. Dizia-me que esse era o maior valor da vida: a simplicidade. Enquanto, eu desde criança quisera ir a capital, conhecer todas as maravilhas que eu só ouvira falar, Jô me dizia que era apenas uma ilusão momentânea da carne, que de todas expectativas que eu criara iriam me decepcionar. Possivelmente, claro. Pois de nada encontraria quando do fruto do pensamento era minha própria criação. Nada chegará a ser tão bom como sonhar, e se tu sonhas tão profundamente, nunca descerás tao fundo e  nunca alcançarás teu sonho, pois a origem de teu sonho é a água que preenche o vazio de sua alma. A água, ela se molda a cada recipiente em que é colocada, assim como o sonho, a expectativa, ela será utópica, e dessa ilusão, você sofrerá. "Nunca preencha o vazio dentro de ti com ideias que nãos sabes de onde surgem, preencha seu vazio com um peixe pescado no rio, com sua própria varam, determinação e dedicação".
    Então, em meu aniversário de 7 anos, Jô, no término da aula, entrega-me um caderno em branco e diz:
- Eis aqui o seu verdadeiro professor. Você de tudo anotará. Procure relatar cada momento de sua vida, cada pensamento. Escreva o que te aconteceu, qual foi sua impressão. Finja que é uma conversa, uma conversa consigo mesmo. Espero que perceba, assim como eu percebo, que escrever alivia o olhar pesado que temos do mundo. Escrever escarnece todos os males que nos arranham. É, de fato, destrinchar esse emaranhado de concepções que se alojam dentro de nós. Precisamos nos ver diretamente no espelho, e o espelho das palavras reflete todo nosso íntimo, expondo-nos para uma folha de papel. No final,  quando parares para ler, algum tempo depois, verás o quanto você progrediu, ou talvez não. Se por acaso suas atitudes e pensamentos não tiverem mudado, eis aí que surge a sua chance de repensar e se reescrever.
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